quinta-feira, setembro 25, 2008

Síndrome de Michael

Um misto de compaixão e sensação de a justiça ter se realizado veio à minha mente quando eu vi Michael (nome fictício) entrar na quadra.

É preciso explicar que a entrega de boletins de nosso colégio realizou-se na quadra de esportes. Nós, professores, nos assentamos a mesas nas quais cartazes foram colados contendo o nome de nossa disciplina. A programação se desenrolava imperturbavelmente.

Foi quando entrou a mãe de Michael. Em poucos minutos, com o boletim do filho nas mãos, ela percorria as mesas espalhadas pelos cantos da quadra, falando com cada professor. Seu ar trazia uma espécie de decepção contagiante. Depois, enquanto eu conversava com o irmão de Michael, o próprio chegou.

Michael vinha de mansinho, como quem sabe o que lhe espera. Eu e outro professor começamos a conversar com ele. Não estou falando de um aluno com problemas de aprendizagem. Michael, como outros adolescentes, não gosta de estudar. O rapaz acostumou-se a não se preocupar, porque no final ele pode alcançar a média através da recuperação paralela. Só que no presente bimestre, Michael descuidou tanto de seus estudos que, quando quis recuperar, já era tarde. “E você não sabia que seu boletim viria com notas ruins?”, perguntei a Michael. “Saber, eu sabia”, foi sua resposta. “Mas achei que daria um jeito no final”, ele completou, estarrecido diante de seu próprio resultado escolar.

Você já se deu conta de que coisas assim não acontecem somente a adolescentes em relação a seus estudos? Você trabalha e não tem hora para almoçar. Não consegue mais se comunicar com sua esposa, que também vive presa às suas próprias atividades. Um dia, vocês acordam e se olham – o espanto é tão grande que um não estranharia se o outro lhe perguntasse o nome. O casamento acaba, porém você não é pego de surpresa. Você sabia que as circunstâncias conduziam o relacionamento a um fim prematuro. Acontece que você simplesmente achou que daria um jeito no final.

Considere isto: uma ferramenta para avaliar a acuidade de nossas escolhas é a análise prévia das consequências que elas trarão. Se levarmos a sério essa análise, por uma questão de racionalidade seremos forçados a ajustar nossa conduta para atingirmos o fim desejado. O problema é que a maioria das pessoas não usa de racionalidade, embora não deixe de enxergar os resultados de suas escolhas a longo prazo. Já ouvi pessoas dizerem que preferem continuar fumando, mesmo correndo o risco de morrerem vitimadas pelo câncer. “Ninguém vive para sempre”, argumentou certa vez um senhor quando lhe perguntei porque ele não parava de fumar, apesar das advertências feitas por um médico.

A irracionalidade nas escolhas leva a um desajuste entre nossa postura e nossa expectativa. Ninguém quer ser infeliz, contrair doenças mortais ou sofrer com um divórcio, mas, através de seu modo de vida, as pessoas projetam esses males. Chamo o desalinho entre escolha e expectativa de “síndrome de Michael”. Os portadores da síndrome de Michael sempre contam com resultados inesperados, soluções de última hora, intervenções mágicas – até que a realidade lhes dê um forte soco no estômago.

Mesmo no campo espiritual, impera a mesma lógica de racionalidade: colheremos o que plantarmos (Gálatas 6:7-9). Não se trata de salvação pelas obras. É questão de coerência. Somos constantemente lembrados de que haverá um julgamento e, em razão da expectativa em torno desse evento, temos de ajustar nossa conduta. Sendo impossível fugir da “ira futura”, resta viver para produzir o “fruto que mostre o arrependimento” (Mateus 3:7 e 8; NVI).

Dentro dessa perspectiva, o apóstolo Pedro formulou a pergunta mais sensata: “Visto que tudo será assim desfeito, que tipo de pessoas é necessário que vocês sejam?” Felizmente, o mesmo Pedro nos fornece a resposta: “Vivam de maneira santa e piedosa, esperando o dia de Deus e apressando a sua vinda” (2 Pedro 3:11 e 12; NVI). Somente avaliando previamente a solenidade da volta de Jesus (“o dia de Deus”), poderemos reajustar nossa vida pela fé, sendo o tipo de pessoa que viva de modo santo e piedoso. Será o suficiente para superar a síndrome de Michael em nossa vida espiritual.

(Douglas Reis, pastor da Igreja Adventista do Sétimo Dia e mantenedor do blog Questão de Confiança.)

Mais bênçãos

Tem sido comum o cristão clamar por bênçãos. Afinal, Deus as prometeu.

Aliás, bênçãos é um tema que conquista qualquer auditório. Pois assim somos nós, cristãos: clamamos o tempo inteiro, queremos mais do trono de Deus, queremos ser abençoados em tudo, queremos mais e mais e mais...

Errado? Claro que não. O filho tem que buscar o Pai, clamando por suas promessas.

Mas cristianismo não é só isso. É mais. Nós não somos um bando de filhotes de pássaros, que ficam amontoados em seus ninhos, piando à espera do alimento. Somos mais que isso.

Se você, hoje, está pedindo uma benção, está clamando um milagre à Deus, permita-me propor uma questão: Você já deu tudo o que tem para o Senhor?

Quer um carro novo. Mas já depositou o atual aos pés de Jesus? Quer um rendimento melhor. Mas o salário até agora recebido tem sido utilizado em honra a Deus? Quer mais saúde. Mas sua vida tem sido usada para a causa de Deus? Quer mais dons. Mas o dom que possui está sendo usado em louvor a Deus?

“Tenho uma surpresa para vocês”, eu disse para meus pequenos filhos antes do almoço. Obviamente, eles alvoroçaram. Então, falei que só ganhariam a tal surpresa depois do almoço. Foi uma das refeições mais tumultuadas da minha vida.

“Eu não quero almoçar”, disse a Lívia, de chofre. “Eu também não”, embarcou na onda o mais novo (Kalel).

Sem chance. Teriam que comer primeiro. “Terminei”, dizia um a cada dois minutos. “Já enchi”, falava o outro, ainda mais rápido.

“Não vai ter surpresa pra ninguém”, esbravejei, perdendo a paciência diante de uma cena que eu mesmo orquestrei.

Eles tinham uma lauta refeição diante deles, mas queriam mais. Não tinham nem aproveitado o que estava em suas mãos e já clamavam pela minha promessa de surpresa.

Respirei, olhei fixamente para eles e pedi: “Almocem, por favor. Se vocês não almoçarem, não vou poder cumprir com minha promessa, pois a surpresa é para aqueles que comerem direitinho.”

Eles acalmaram (os “terminei” e “já enchi” passaram a ter um intervalo um pouco maior).

Depois de comerem (e lavarem boca e mãos), ganharam a prometida surpresa (aquele ovo de chocolate com brinquedo dentro – ou, melhor dizendo, aquele brinquedo coberto com um ovo de chocolate).

Pode acreditar, eu queria dar a “surpresa” tão logo cheguei em casa. Mas, se eu fizesse isso, ninguém almoçaria do verdadeiro alimento.

Refletindo sobre o assunto, lembrei-me da “mulher pecadora” (Lucas 7:37 em diante), que comprou um vidro caríssimo de unguento e o depositou aos pés de Jesus. Ela não pediu nada. Deu tudo o que tinha e derramou todo o perfume aos pés do Mestre. Depois disso, enxugou-os com seus cabelos.

O que ela estava pedindo naquele momento? Nada. O que ela queria? Uma coisa bem simples: estar perto do Mestre.

Querer bênçãos sem se dispor a estar perto de Jesus é inútil. Querer ser abençoado sem depositar tudo o que temos, sem nos alimentarmos do verdadeiro alimento, é uma ilusão.

Quanto mais nos dedicamos, quanto mais nos embrenhamos na obra de Deus, quanto mais damos de nós para Deus, mais somos abençoados.

Os mesquinhos, aqueles que guardam apenas para si o sucesso, a saúde e os bens que possuem, não podem alcançar bênçãos vindas, verdadeiramente, do trono de Deus.

Atualmente, só consigo ver uma maneira de receber mais: dar mais, pois Deus promete algo chamado RESTITUIÇÃO. E Ele só pode restituir aquilo que depositarmos aos Seus pés.

Eu gostaria de convidá-lo para, junto de mim, depositar tudo o que temos aos pés de Jesus e orarmos: Eis-me aqui, Senhor. Tudo o que sou, tudo o que tenho agora é Teu. Usa-me da forma mais intensa possível, pois sou Teu. Meus bens, meus dons, minha família e tudo o que tenho coloco no Teu altar, para servir a Ti. Estou aos Teus pés e aqui quero estar para sempre. Abençoa-me à medida que demonstro estar crescendo, pois, sendo fiel com o pouco que tenho, pretendo ser com as muitas bênçãos que virão. É minha oração, em nome de Jesus, amém.

Quando Jesus ressuscitou, aquela “mulher pecadora” foi a primeira que o viu. Não foi por acaso. Foi em virtude de ela ter entregado tudo ao Mestre.

Quando Jesus voltar, os que se entregaram por completo estarão entre os primeiros a abraçá-lo.

(Denis Cruz, mantenedor do blog IASD Mundo Novo e autor do livro Além da Magia.)