Já vai para dezesseis anos que estou aqui na Volvo, uma empresa sueca. Trabalhar com eles é uma convivência, no mínimo, interessante. Qualquer projeto aqui demora 2 anos para se concretizar, mesmo que a idéia seja brilhante e simples. É regra.
Então, nos processos globais, nós (brasileiros, americanos, australianos, asiáticos) ficamos aflitos por resultados imediatos, uma ansiedade generalizada. Porém, nosso senso de urgência não surte qualquer efeito nesse prazo.
Os suecos discutem, discutem, fazem "n" reuniões, ponderações e trabalham num esquema bem mais slow down. O pior é constatar que, no final, acaba sempre dando certo no tempo deles, com a maturidade da tecnologia e da necessidade: bem pouco se perde aqui.
E vejo assim:
1. O país é do tamanho de São Paulo;
2. O país tem 2 milhões de habitantes;
3. Sua maior cidade, Estocolmo, tem 500.000 habitantes (compare com Curitiba, que tem 2 milhões);
4. Empresas de capital sueco: Volvo, Scania, Ericsson, Electrolux, ABB, Nokia, Nobel, Biocare (nada mal, hein?);
5. Para se ter uma idéia, a Volvo fabrica os motores propulsores para os foguetes da NASA.
Digo para os demais nesses nossos grupos globais: os suecos podem estar errados, mas são eles que pagam muitos dos nossos salários. Entretanto, vale salientar que não conheço um povo, como povo mesmo, que tenha mais cultura coletiva do que eles.
Vou contar para vocês uma breve história só para dar uma noção.
Na primeira vez que fui para lá, em 1990, um dos colegas suecos me pegava no hotel toda manhã. Era setembro, frio, nevasca. Chegávamos cedo na Volvo, e ele estacionava o carro bem longe da porta de entrada (são 2.000 funcionários de carro). No primeiro dia não disse nada, no segundo, no terceiro... Depois, com um pouco mais de intimidade, numa manhã, perguntei:
"Você tem lugar demarcado para estacionar aqui? Notei que chegamos cedo, quando o estacionamento ainda está vazio, e você deixa o carro lá no final."
Sua resposta foi simples assim:
"É que chegamos cedo. Então, temos tempo de caminhar – quem chegar mais tarde, já vai estar atrasado, melhor que fique mais perto da porta. Você não acha?"
Olha a minha cara! Ainda bem que levei essa logo na primeira. Deu para rever bastante os meus conceitos dali para frente.
Há um grande movimento na Europa hoje chamado slow food. A Slow Food International Association, cujo símbolo é um caracol, tem sua base na Itália. O que o movimento Slow Food prega é que as pessoas devem comer e beber devagar, saboreando os alimentos, "curtindo" seu preparo, no convívio com a família, com amigos, sem pressa e com qualidade. A idéia é contrapor-se ao espírito do fast food e o que ele representa como estilo de vida, que o americano endeusou.
A surpresa, porém, é que esse movimento do slow food está servindo de base para um movimento mais amplo, chamado slow Europe, como salientou a revista Business Week numa edição européia. A base de tudo está no questionamento da "pressa" e da "loucura" geradas pela globalização, pelo apelo à "quantidade do ter", em contraposição à qualidade de vida ou à "qualidade do ser".
Segundo a Business Week, os trabalhadores franceses, embora trabalhem menos horas (35 horas por semana), são mais produtivos que seus colegas americanos ou ingleses. E os alemães, que em muitas empresas instituíram uma semana de 28,8 horas de trabalho, viram sua produtividade crescer nada menos que 20%. Essa chamada slow atitude está chamando a atenção até dos americanos, apologistas do fast (rápido) e do do it now (faça já).
Portanto, essa "atitude sem pressa" não significa fazer menos, nem ter menor produtividade. Significa, sim, fazer as coisas e trabalhar com mais "qualidade" e "produtividade", com maior perfeição, atenção aos detalhes e com menos stress. Significa retomar os valores da família, dos amigos, do tempo livre, do lazer, das pequenas comunidades, do “local” - presente e concreto - em contraposição ao "global" - indefinido e anônimo. Significa a retomada dos valores essenciais do ser humano, dos pequenos prazeres do cotidiano, da simplicidade de viver e conviver e até da religião e da fé. Significa um ambiente de trabalho menos coercitivo, mais alegre, mais "leve" e, portanto, mais produtivo, onde seres humanos felizes fazem com prazer o que sabem fazer de melhor.
Gostaria que você pensasse um pouco sobre isso. Será que os velhos ditados "devagar se vai ao longe" ou, ainda, "a pressa é inimiga da perfeição" não merecem novamente nossa atenção nestes tempos de desenfreada loucura? Será que nossas empresas não deveriam também pensar em programas sérios de "qualidade sem pressa" até para aumentar a produtividade e qualidade de nossos produtos e serviços sem a necessária perda da "qualidade do ser"?
Algumas pessoas vivem correndo atrás do tempo, mas parece que só alcançam quando morrem enfartados ou algo assim. Para outros, o tempo demora a passar; ficam ansiosos com o futuro e se esquecem de viver o presente, que é o único tempo que existe. Tempo todo mundo tem, por igual! Ninguém tem mais nem menos que 24 horas por dia. A diferença é o que cada um faz do seu tempo.
E quer saber do melhor? Parabéns por você ter lido até o final! Muitos não lerão esta mensagem até o final, porque não podem "perder" o seu tempo neste mundo globalizado.
Pense e reflita. Até que ponto vale a pena deixar de curtir sua família, de ficar com a pessoa amada, ir pescar no fim de semana ou outras coisas? Poderá ser tarde demais... saber aprender para sobreviver...
Autor desconhecido (brasileiro que vive na Europa).
Nota: Já dizia Jesus: “Não andeis ansiosos pela vossa vida, quanto ao que haveis de comer ou beber; nem pelo vosso corpo, quanto ao que haveis de vestir. Não é a vida mais do que o alimento, e o corpo, mais do que as vestes? [...] Buscai, pois, em primeiro lugar, o seu reino e a sua justiça, e todas estas coisas vos serão acrescentadas. Portanto, não vos inquieteis com o dia de amanhã, pois o amanhã trará os seus cuidados; basta ao dia o seu próprio mal.” (Mateus 6:25, 33, 34)
2 comentários:
Recebi hoje por e-mail este PPS e buscando a mensagem através do Google, cheguei aqui. Seu post ficou ainda mais interessante com a passagem bíblica incluída. Parabéns.
Muito bom,
tudo vai da cultura de cada povo.
Só não gostei da passagem bíblica.
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